Você já pensou em desistir
Não foi uma pergunta.
Você já olhou para a vida e sentiu arrependimento, vergonha de suas escolhas. Lamentou não ter começado uma faculdade, seguir a profissão que seus pais almejavam. Já culpou o azar, chorou por derrotas passadas. E aquele amor impossível? Ele ainda aluga lágrimas no seu rosto.
E, no âmago do seu sofrimento, você contemplou a escuridão. Fechou os olhos e desejou dormir profundamente, que o tempo parasse, na esperança do vazio dar-lhe descanso e uma oportunidade para recomeçar. Renascer.
Você já o fez. Eu também. Todos nós.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) detectou um aumento de 25% na prevalência (número de casos em uma população) da ansiedade mundial durante o primeiro ano da pandemia. No Brasil, a pesquisa Vigitel 2021 relatou que, em média, 11,3% da população (mais de 24 milhões) já recebeu o diagnóstico médico da depressão, doença que é considerada o mal do século.
Segundo o neurocirurgião Fernando Gomes, diversas podem ser as causas como eventos traumáticos e fatores genéticos. Não só isso, transtornos psiquiátricos, estresse crônico, disfunções hormonais, alcoolismo e uso de drogas estão entre os fatores de risco. E claro, os transtornos da pandemia também estão inclusos vide a paralisação das atividades, isolamento social, demissões e readaptações.
Levando em conta os agravantes, um estudo publicado na Scielo (“A pandemia da COVID-19 e as mudanças no estilo de vida dos brasileiros adultos: um estudo transversal, 2020”) feito com 45.161 pessoas, de 18 ou mais anos, mostrou que “34% dos participantes fumantes aumentaram o consumo durante a pandemia. Também foi observado um aumento do consumo de álcool em 17% dos entrevistados.”
A depressão atinge 5% da população adulta, mas um estudo contido na revista The Lancet em um relatório da Associação Mundial de Psiquiatria sobre Depressão acusa que 70% dos casos sofre com a falta de diagnóstico, tratamento e descaso.
Ou seja, as pessoas não apenas estão no momento mais delicado de suas vidas, mas fazem parte de um ciclo vicioso que se retro alimenta. Estar deprimido hoje é mais comum, não é necessário muito esforço para entender. No entanto, ao invés de serem complacentes uns com os outros, as pessoas cultivam hábitos nocivos, buscam refúgio em substâncias ou atitudes que apenas provocam alívio efêmero, criam quadros de ansiedade e depressão para então, caçoar e negligenciar quando estes se agravam.
Realmente, não se deve analisar o todo pela parte, mas é frustrante como uma reflexão rápida demonstra que as pessoas estão, aos poucos, deixando de ser as vítimas para se tornarem parte do problema. O mais impressionante é que a população age com impetuosidade sem ao menos levar conta que tem grandes chances de passar por problemas parecidos. Segundo dados do Minha Vida, a prevalência da depressão chega a 19%, ou seja, uma a cada cinco pessoas sofrerá com o distúrbio ao menos uma vez na vida. Ansiedade, angústia, desânimo, falta de prazer e maior dificuldade para fazer tarefas cotidianas são alguns dos sintomas.
De fato, você já pensou em desistir e, se não o fez, provavelmente pensará. A vida abala a todos com derrotas, sempre será necessário se reerguer e, ainda por cima, a felicidade é subjetiva, cada um tem seu próprio caminho para trilhar até lá.
Ao compreender que um dia fará parte deste ciclo nocivo, de pessoas deprimidas, de hábitos ruins, de agentes julgadores e negadores, pesará menos a mão ao lidar com casos públicos de depressão. Pois, o crivo que der ao outro em breve lhe será dado.
A depressão tem cura. Consultas regulares a psicólogos e psiquiatras podem não ser acessíveis, mas se existe algo disponível a todos é o acolhimento e a empatia.
Entender que os problemas giram, passam e retornam, que a vida é uma luta constante e que não se pode entender a dor alheia até vivencia-la de fato, é o primeiro passo para vencer.
Afinal, se você já pensou em desistir e chegou ao fim deste texto, significa que não o fez, correto?
Gabriel Viola – Estudante de Jornalismo.
